Quem, indo ou vindo no caminho de Brusque, em Claraíba, Nova Trento, ainda não parou para experimentar um saboroso café com strudel, torta mineira, cuca ou outros dos tantos doces da Martha Frehner Haus? Poucos, certamente. Mas o que muitos não sabem é que esse negócio chegou ao sucesso atual não só pela coragem e ousadia de um jovem casal, mas, principalmente, pelos dotes culinários de uma amável senhora, a dona Martha Frehner, que faleceu ano em junho do ano passado, aos 87 anos.
Foi em 2008 que O Trentino fez uma reportagem especial com Martha, que contou que a história de sucesso da confeitaria começou em 1991, quando o jovem brusquense Moisés Tambosi conheceu Rut, a filha de Martha, na fiação Renaux, onde ambos trabalhavam. Nos finais de semana, quando Moisés vinha para Claraíba, se deliciava com as cucas da futura sogra. Não tardou a fazer-lhe uma proposta: se ela se dispusesse a apresentá-lo a pessoas conhecidas, em Claraíba, ele se disporia a tentar vender aquelas deliciosas cucas, de casa em casa, nos finais de semana.
Na tarde da primeira sexta-feira de maio de 1991, Moisés saiu de bicicleta com 12 cucas a tiracolo, oferecendo-as nas residências. Vendeu nove. Um começo mais que bom. Logo em seguida, a clientela queria comprar, além de cucas, todos os outros doces que Martha sabia fazer, como bolos, bolachas e tortas.
As coisas foram tão bem que Moisés, já casado com Rut, decidiu se mudar para Claraíba em 1995. Passou a atuar como produtor e fornecedor de leite para a indústria de laticínios Trentolat, mas também incrementava o orçamento com a venda das cucas e doces.
Em 1997, surgiu a necessidade de ampliar o negócio. A oportunidade foi dada pelo escritório da Epagri, através da então extensionista Cinelândia Venier Cipriani, que o convidou para montar um estande na festa Incanto Trentino daquele ano.
Vendeu tão bem que Cinelândia se dispôs a acompanhar Moisés em visitas de degustação das cucas de Martha em vários estabelecimentos comerciais do centro de Nova Trento. A iniciativa deu certo e a freguesia foi aumentando cada vez mais.
O sucesso do empreendimento familiar liderado por Moisés Tambosi fez amadurecer a ideia da criação de um ponto de venda próprio, em Claraíba. O local onde está hoje foi escolhido por causa do valor do terreno e por se situar no meio de uma reta, sem vizinhança por perto, na margem da rodovia. Coincidentemente, a pequena localidade do distrito se chama Alemanha, porque foi ali que se instalaram os primeiros colonos alemães em Nova Trento. O ponto tinha que ser algo chamativo. Um sobrinho de Martha, que mora na Suíça, mandou na época um catálogo com vários modelos de construções em estilo alpino.
A construção da Martha Frehner Haus (“haus” é o mesmo que casa, em alemão), com 400 m2 de área, foi inaugurada em 2001. Tudo o que a família tinha foi investido na construção. Moisés lembra, ainda hoje, que teve um pedido de empréstimo negado por um gerente de banco. “Ele disse que era um investimento de alto risco e que não daria certo. Depois, acabou sendo cliente nosso”, brinca, lembrando essa passagem.
“Segredo do negócio?”. Moisés responde: “Acreditar nele, ter uma boa dose de coragem, não descuidar jamais da qualidade do produto, investir no bom atendimento e ter uma sogra como Martha”. De fato, isto pode ser comprovado em qualquer visita à Martha Frehner Haus. A variedade de cucas, bolos e tortas (doces e salgadas) dá água na boca e o atendimento é sempre gentil por parte de todos os funcionários.
Difícil alguém, fora de Nova Trento, provar uma maravilhosa torta com a assinatura de Martha Frehner e não ficar curioso sobre o significado de tal nome. Ele denomina uma afável senhora que nasceu localidade de Serra Vencida (atual município de Presidente Getúlio), no Médio Vale do Itajaí. O pai, Jacob, era suíço, e a mãe, Frida, alemã.
Agricultora, saiu de casa em 1949, aos 19 anos, para trabalhar como empregada doméstica, em Rio do Sul. Em 1953, recebeu uma oferta para trabalhar em Brusque, também como doméstica, mas não numa casa qualquer. Martha foi admitida na cozinha da família do empresário Otto Renaux, que era o filho mais velho de Carlos Renaux, o fundador das empresas Renaux. Ali, trabalhou nove inesquecíveis anos.
“O Dr. Otto e sua esposa, Dona Ida, ofereciam muitas festas em sua enorme casa, em Brusque. Não havia o costume de fazer comemorações nos clubes, como agora. Tudo era em casa. Algumas reuniam mais de 50, 60 pessoas. Eram festas de casamento, Natal, Ano Novo, confirmação (crisma), aniversários e para homenagear visitas importantes, vindas de fora”, lembrou Martha, que além de seus dotes de doceira, aprendeu muito com outras senhoras que trabalhavam com ela.
Para aqueles verdadeiros banquetes Martha e equipe tinham que se desdobrar para diferentes cardápios num mesmo dia, já que alguns começavam pelo almoço, passavam pelo café no meio da tarde, jantar e, algumas vezes, ceia. Pelos fogões, fornos e panelas da mansão dos Renaux desfilaram alguns milhares de assados de perus, patos e marrecos (estes com repolho roxo), que tanto deliciavam o paladar dos sempre ilustres convidados de Otto e Ida.
Ao conhecer e casar com o agricultor neotrentino Helmuth Wilke, em 1962, Martha deixou o emprego e veio morar em Claraíba, mas conservou seus dotes culinários intactos. Toda vez que ia a Brusque participar dos eventos da Ordem Auxiliadora das Senhoras Evangélicas Luteranas (uma versão do Apostolado da Oração da Igreja Católica) não esquecia de levar doces para elas, principalmente para a querida ex-patroa, Ida Renaux.
Nos últimos anos antes de sua partida, dona Martha ficou a maior parte do tempo em sua residência, mas nunca deixou de frequentar a Casa dei Nonni, clube de idosos que tem atividades semanais no centro de Nova Trento e do qual foi eleita rainha num concurso. Simpatia e doçura nunca lhe faltaram. É fato.
“quem gosta do ofício sempre tem seu próprio jeito de fazer melhor”
A gentil senhora também fazia deliciosas geleias e bolachas confeitadas, vendidas na lojinha da Martha Frehner Haus. Além do toque pessoal – “quem gosta do ofício sempre tem seu próprio jeito de fazer melhor” – Martha confessou em entrevista dada a O Trentino em 2008 que não tinha nenhum segredo especial para suas tortas e cucas serem tão apreciadas. Mas deu uma dica importante: “Doce bom tem que ter manteiga boa, não margarina”.